Lançando
um filme por ano, Woody Allen tem o que chamamos de Estilo, ou “Cinema de
Autor”, se preferirem. Suas histórias podem mudar, a ambientação pode mudar,
pode ser Londres, Roma, Paris ou Los Angeles e a sempre amada e admirada Nova
Iorque- como neste caso. Mas o fato é suas histórias continuam basicamente as
mesmas na essência: Personagens neuróticos, entrechos amorosos, reflexões sobre
o sentido da vida ou a busca pelos sonhos e objetivos.
Mesmo
retrabalhando temas, Allen consegue fazer eles soarem frescos, e ainda
magicamente encantadores. É o caso de “Café Society”, que se passa em 1930,
durante a Era de Ouro de Hollywood.
O
Jovem Bobby(Jesse Eisenberg), cansado da rotina na joalheria da família em Nova
Iorque, quer se tornar um famoso roteirista em Hollywood, o que faz a mãe do
rapaz, Rose(Jeannie Berlin), implorar ao tio do rapaz- e irmão desta,
Phil(Steve Carell) por uma chance. Só que Bobby se apaixona pela secretária
deste, Vonnie(Kristen Stewart), enquanto ela se apresenta a cidade ao jovem
sonhador.
Woody
Allen não mentiu quando disse que “Café Society” era como um romance, e que por
está razão era o narrador da trama, desse romance. Café Society é um filme
simples, mas mágico,delicioso e extremamente agradável de se assistir. Ouso
dizer que é seu melhor filme desde “Meia -Noite em Paris”. O filme estrelado
por Owen Wilson continua sendo o meu favorito de Allen, mas esse estrelado por
um talentoso Jesse Eisenberg chegou perto, bem perto. Já garantindo um lugar
entre meus favoritos.
Estruturado
como um retrato, um recorte, ou mesmo como disse o próprio diretor, um romance
sobre a vida de Bobby, “Café Society” é um filme sobre o fascínio, sobre o
sonho dourado(afinal, a grama do vizinho é sempre mais verde, ou pelo menos
aparenta ser. O longa é como aquele livro absolutamente encantador que você não
quer que acabe, com aquele personagem que parece ser seu alter ego de tanto que
nos identificamos com ele.
Woody
construiu uma história repleta de magia, encanto e glamour. Ao assistir ao
filme embarcamos numa atmosfera glamorosa de sonho. O sonho americano das
mansões de Hollywood, das festas, das negociações, do ar estrelado, da magia do
cinema de estrelas e diretores como Billy Wilder e Rudolph Valentino de um lado, a magia da Café Society, de outro, onde
Bobby encontra o seu lugar ao sol. Allen pode rodar o mundo, Roma,
Paris,Londres ou Barcelona, mas acaba sempre retornando ao seu lugar de origem.
Ah, Nova Iorque, sempre Nova Iorque.
Allen estruturou muito
bem o seu enredo. De um lado, a era de ouro de Hollywood, de outro a típica
família judia neurótica levemente disfuncional com seu humor irônico,
sarcástico e mordaz característico. Tudo isso, unida a uma versão romanceada e
satírica da máfia da época, através do irmão de Bobby, Ben(Corey Stoll).
De fato, Woody
revisitou antigos trabalhos nesse novo filme. Do encanto com sonho dourado, ter
uma profissão que não a sua, viver em um lugar- ou época que não os seus,
remetem a “Meia-Noite em Paris”, o
cinema e suas estrelas como modo de fascínio e entretenimento de “A Rosa Púrpura do Cairo”, do mundo das
artes colidindo com a máfia de “Tiros Na
Broadway”, ou ainda a magia e o encanto meio inocente de uma época vista
com muito glamour como “A Era do Rádio”.
Allen imergiu o
espectador em um universo mágico priorizando sua história muito bem construída,
com pontos bem amarrados que se interligam, cuja estrutura remete ao clássico “Se Meu Apartamento Falasse” de Billy
Wilder(observem o clímax do filme). Tudo isso somado a conjunto de fatores que vão desde a montagem episódica,
a belíssima fotografia que mescla um azul solar, com o dourado próprio do
glamour entre outros tons, aos atores e a direção e o roteiro de Allen, que
como sempre prioriza a dinâmica ator-texto, abusa dos closes e dos planos de
conjunto.
O humor de
situação,involuntário, mordaz, sarcástico e irônico de Allen se faz presente
com Jesse Eisenberg assumindo o clássico alter ego do diretor mais uma vez. O
ator faz de Bobby, um autentico jovem idealista e sonhador, mesclando a visão
inocente do personagem sobre o mundo de glamour a qual sonha pertencer com um
humor sarcástico, brilhando em situações em que Bobby falava com uma
sinceridade desconcertante ou simplesmente agindo. O humor aqui, como grande
parte dos trabalhos de Woody Allen, surge naturalmente das situações, sem
grande esforço. Muitas vezes o personagem não falava nada, apenas uma pequena ação
ou a constatação de um fato já provoca gargalhadas.
Os personagens estão em
processo de construção ou desconstrução durante o filme. Assim, é delicioso ver
Jesse Eisenberg(Bobby), Vonnie(Kristen Stewart) e Veronica(Blake Lively) e
Phil(Steve Carell), desconstruírem as “personas” de seus personagens, ou apenas
demonstrando novas facetas desses personagens, que afinal de contas são seres
humanos, e a observação- por vezes sarcástica da alma humana é uma das matrizes
da obra de Woody Allen. Talvez por isso o diretor tenha o amor e os inevitáveis
encontros e desencontros amorosos como uma de suas
marcas. Pois quando amamos, a alma humana fica naturalmente vulnerável, permitindo
enxergar o seu interior com facilidade.
Por
fim, “Café Society” é uma viagem deliciosa e mágica que Woody Allen nos
proporciona. Ao nos fazer viajar para a era de ouro de Hollywood e para a efervescência
da Café Society e acompanhar os sonhos de Bobby em meio ao glamour, Woody nós
dá uma passagem para um universo encantador. Uma pena que a viagem é curta,
como um bom livro que não conseguimos largar antes do fim, e quando acabamos,
ficamos com gosto de quero mais.
Obrigado Woody, por mais uma viagem mágica, encantadora, sensível e delicada
aos sonhos.
Sempre espero com muita ansiedade assistir a um filme do cineasta, pois sei que terei duas horas de puro cinema autoral.
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