Em 2006 o documentarista Eduardo Coutinho colocou um anuncio no jornal
convocando mulheres a compartilhar suas historias de vida para a lente de uma
câmera. Historias essas que seriam encenadas por atrizes traçando assim um
paralelo entre o real e o fictício. O resultado é o documentário “Jogo de
Cena”.
Os depoimentos foram colhidos pelo próprio Eduardo Coutinho que assume
aqui a postura de entrevistador utilizando-se de um ambiente naturalmente neutro
(o teatro Glauce Rocha no RJ) para criar um documentário pessoal e livre no
processo criativo no que diz respeito às depoentes e as atrizes
respectivamente.
A liberdade de criação que Eduardo Coutinho da a suas atrizes na hora de
dramatizar os relatos das entrevistadas garante ao espectador a possibilidade
de perceber nuances dramáticas e performáticas daquela atriz em questão que
antes talvez passasse imperceptível.
Fatores como os dispositivos de criação dramática daquelas atrizes. Como
elas fazem para atingir aquele ápice dramático e emocional naquela cena. E se o
fato de se tratar de uma história real influencia no dispositivo de criação das
atrizes. O componente emocional também é um fator bastante explorado por
Coutinho tanto pelas depoentes quanto pelas atrizes. De forma bastante
delicada, o diretor permite que a depoente reviva livremente aquele fato
principalmente agora que ele é dramatizado. E quanto às atrizes Coutinho
investiga o quanto dramatizar aquele fato que lhes foi contado mexeu com o seu
emocional. Pois como todos sabem a matéria-prima do ator é a emoção. É daí que
saem as respostas mais surpreendentes desde aquela que atua da forma mais
visceral possível até aquela que se esforça para separar as emoções e não
esboçar uma reação descontrolada.
De novo retornamos a questão do método de criação que por sinal é um tema
recorrente que percorre todo o filme. O fato de o diretor proporcionar as
atrizes um método livre de composição de personagem abrindo assim espaço para
as mais variadas versões da mesma história e mais ele quer saber da própria atriz
a sua visão daquele relato o que acaba por se tornar um aspecto interessante
para o espectador de percepção da autoficção.
O detalhe de extrema importância no documentário é a montagem (ou a falta
dela). Digo isso porque Coutinho começa intercalando um depoimento e uma
dramatização de repente isso muda e ele começa explorar outras vertentes do
mesmo esquema. De certo por ter consciência de que esse esquema poderia cansar
a certo momento.
“Jogo de Cena” é um excelente documentário de Eduardo Coutinho que
realiza aqui um trabalho primoroso de investigação da alma humana. “Jogo de
Cena” vai além, pois abre espaço para uma discussão valiosa sobre o processo
criativo e dispositivos de criação performáticos e cinematográficos que é de
suma importância.
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